6 de abril de 2010

Primavera I

Acordo segundos antes de o despertador tocar. Desligo-o antes que o seu som estridente arruíne a minha manhã. Sinto a energia a ocupar lentamente cada canto do meu corpo e a empurrá-lo sem esforço para fora da cama.

O sol tenta entrar no quarto pelas brechas das portadas, parecendo querer adiantar o nosso encontro. Na minha cabeça digo-lhe para esperar, já falta pouco.

As portas do armário deslizam apenas com um toque e escolho cuidadosamente cada peça de roupa que vou usar. Só a roupa interior fica ao acaso.

Sem acender nenhuma luz percorro o corredor em direcção à casa de banho onde tenho o primeiro contacto com o sol. Através das janelas sem cortinas vejo o dia que se avizinha e cresce um sorriso no meu rosto. Cai o pijama no chão e entro no duche. A água quente refresca-me a mente. Do nada oiço a minha voz a cantarolar In Exile dos Thrice.

Corpo seco e de volta ao quarto com a toalha enrolada à volta da cintura olho para a roupa estendida em cima da cama. Digo para mim que está na hora de vestir o uniforme. Visto a roupa interior seguido de um par de calças de ganga pretas. Paro-me por segundos ainda a segurar a t-shirt vermelha enquanto pela minha cabeça passam todas as variáveis possíveis para decidir se terei calor ao combinar a t-shirt com uma camisa. Chego a acordo comigo próprio que não será um peso significativo caso tenha que despi-la. O toque final vem com o calçar dos meus companheiros de longa data. Estes velhos Chuck Taylor All Star pretos e brancos contariam, se capazes, mais histórias do que a minha memória alguma vez conseguirá armazenar.

Olho para o pulso e confirmo que ainda tenho tempo para tapar o buraco que se faz ouvir no meu estômago. Ao abrir a porta do frigorífico este parece vazio mas depressa revela que o seu interior contém exactamente o essencial. Retiro um pacote de leite que, ainda com a frescura do frigorífico, uso para afogar os cereais Crunch que tinha despejado numa tigela. Perco a conta às vezes que levo a colher à boca até apenas restar o leite na tigela. Esvazio o seu conteúdo achocolatado e olho novamente para o relógio. Está na hora.

4 comentários:

Anónimo disse...

Tá na hora, tá na hora, do pessoal se ir embora.
Enfrentar o dia, de pés no chão e cabeça no ar.
Mais um dia, mais uma noite.
Vá pessoal, toca a andar.

André Carvalho disse...

Melhor descrição é impossível. E o teu "Está na hora" lembrou-me o 24. Imagino agora o ecrã a dividir-se em quatro ao som de um cronómetro. lol

Anónimo disse...

Melhor descrição é impossível. E o teu "Está na hora" lembrou-me o 24. Imagino agora o ecrã a dividir-se em quatro ao som de um cronómetro. lol

André Pereira disse...

Gostei, simples e mundano. Normal.
Estou curioso para ver o que sai daqui.