19 de junho de 2011

Primavera III

Já com a chave na ignição e o rugido do motor a misturar-se com o som das aves lá fora, sinto-me pronto para partir, mas não sem antes pôr a tocar o CD que torna todo o acto de conduzir muito mais emocionante. O CD entra e em menos de dois segundos as primeiras notas da Bloodmeat dos Protest the Hero abafam todos os sons que entram pelas janelas abertas do carro. Meto a primeira mudança e arranco. Já falta pouco…

A meio da viagem algo estranho ocorre. Sem aviso o meu corpo começa a desvanecer e a minha visão a enevoar. Quando volto a mim já o carro está fora da estrada e puxo imediatamente o travão de mão fazendo as rodas derrapar na gravilha. Só tenho tempo de abrir a porta e já uma onda de vómito sai da minha boca em direcção ao chão.

Passam minutos até finalmente conseguir recuperar e os carros continuam a passar por mim sem ninguém parar sequer para perguntar o que se passa. Pego no telemóvel para ver as horas e noto que tenho várias chamadas não atendidas e mensagens no voicemail (que decido ignorar). São dela. Tento ligar de volta enquanto penso que para a próxima não deveria ter a música tão alta para poder ouvir o telemóvel. Novamente a chamada vai parar ao voicemail e volto a sentir-me frustrado. Decido voltar imediatamente ao meu percurso, limpo a boca com um lenço e arranco antes que me atrase.

*****

Finalmente chego ao meu destino e estaciono o carro em frente ao portão de entrada da casa como é habitual. Saio do carro e dirijo-me ao portão mas quando vou a tirar as minhas chaves do bolso noto que o portão está destrancado. Acho estranho, não é normal, mas decido entrar de qualquer maneira. Quando chego à porta da casa noto aquilo que inicialmente a vegetação me impediu de ver, a porta está aberta e a fechadura parece forçada. Naquele momento passam-me pela cabeça todos os pensamentos negativos possíveis e antes de poder escolher um já estou a correr para o interior da casa. Grito pelo nome dela e procuro-a em todas as divisões da casa até chegar ao quarto dela. A porta estava quase fechada mas com um encontrão com o ombro abro-a. O meu corpo entra em choque imediato com a visão e da minha mão cai a caixa que trazia.

As paredes, o tecto e o chão estão pintados de vermelho, na cama vejo um corpo com as mãos atadas por cordas à cabeceira e completamente coberto de sangue e cortes profundos. Reconheço-a e grito o nome dela. Grito outra vez e outra vez e outra vez… cada vez mais alto até acabar por perder a força nas pernas e cair com um estrondo nos meus joelhos. Não sinto a dor, não sinto nada e volto a gritar o nome dela. Grito mais uma vez até me faltar a voz e perder todas as forças. Caio com a cara numa das poças de sangue fresco e tenho uma última visão antes de desmaiar:
O anel de noivado ainda dentro da caixa que trazia na mão há segundos atrás…

Fim